j) Sentimento de culpa excessiva:
A culpa é o sentimento de responsabilidade pelos resultados negativos de um acontecimento. Nos estados depressivos, torna-se excessiva e o indivíduo assume de forma exagerada e integral a responsabilidade pela ocorrência de todo tipo de evento negativo atual ou passado, mesmo nos casos em que sequer teve alguma participação ou obrigação de envolvimento. Não considera, por exemplo, as circunstâncias externas ou a participação de outras pessoas.
Ocorre de forma mais severa quando o indivíduo não tem mais condições de trabalhar e realizar atividades do dia a dia. Isto, associado ao sentimento de inutilidade, faz com que se considere “um estorvo” para pessoas próximas, chegando, em casos mais severos, a cogitar suicídio por acreditarem que “só atrapalham” e “dão muito trabalho”. Também pode ocorrer a crença de que os sintomas depressivos são um castigo por erros do passado ou mesmo um castigo de Deus por ter sido mau.
k) Diminuição da capacidade de pensar, de se concentrar ou de tomar decisões:
Como decorrência dos baixos níveis de energia, o indivíduo apresenta lentidão do pensamento e do raciocínio, como já mencionado. Por este motivo, não consegue direcionar sua atenção para o que está fazendo ou pensando. Fica então muito disperso, especialmente quando há vários estímulos externos. É comum, por exemplo, evitar situações sociais por não conseguir acompanhar uma conversa. Devido a este quadro, tomar decisões pode se tornar uma tarefa difícil, uma vez que exige concentração e raciocínio acurado para avaliar todas as possibilidades.
l) Pensamentos recorrentes de morte, ideação suicida, plano suicida ou tentativa de suicídio:
Pensamentos de morte são muito comuns no Episódio Depressivo Maior (EDM). Variam desde um desejo passivo, expresso como “queria não acordar pela manhã” ou “queria dormir para sempre”, até uma vontade real de acabar com a própria vida – ao que chamamos de ideação suicida. No plano suicida já existe toda uma estratégia pensada de como iria se matar, com detalhes tais como hora, local e método de suicídio. Mais sobre suicídio, clique aqui.
Nunca é demais lembrar do CVV – Centro de Valorização da Vida, canal de suporte para indivíduos com intenção suicida. Funciona 24 horas por dia e é totalmente gratuito. Pode-se acessar os seus serviços através do site https://www.cvv.org.br/ ou ligando para188.
m) Problemas de memória:
Apesar de ser um sintoma muito frequente no EDM, problemas de memória, surpreendentemente, não estão entre os critérios necessários para o diagnóstico. O esquecimento é um sintoma que gera muita angústia. “Nunca sei onde coloquei minhas chaves”, “estou sempre procurando minha carteira com documentos porque não sei onde deixei”, “saio de casa e fico pensando e pensando se tranquei a porta”.
Em geral, a memória imediata (que dura de segundos a poucos minutos) e a recente (que dura de minutos a poucas horas) são as mais prejudicadas. A memória remota está geralmente preservada, a não ser em casos muito graves. É um sintoma bastante perturbador e não é raro as pessoas acreditarem estar com uma doença muito grave ou então iniciando um quadro de demência.
n) Sintomas psicossomáticos:
Sintomas físicos com causa psíquica – ou sintomas psicossomáticos, são muito comuns. Dores musculares e nas articulações, dores de cabeça, diarreia, constipação intestinal, sensação de ondas de calor, aperto no peito, falta de ar, tontura, queimação no estômago (epigastralgia), arrepios, dores abdominais, entre outros sintomas, ocorrem e podem desviar a atenção do foco principal, que é o estado depressivo. Assim como a memória, não estão contemplados nos critérios diagnósticos, com exceção da fadiga.
Sua ocorrência pode muitas vezes confundir e retardar o diagnóstico. Pelo fato de terem uma localização “visível”, e serem menos carregados de preconceitos, são muito mais relatados em consulta que os sintomas depressivos. Na mesma direção, são mais valorizados pelos médicos.
4. Comorbidades:
Até pouco tempo atrás, acreditava-se que transtornos psíquicos ocorrendo fossem isoladamente a regra. Chegava-se a incentivar o diagnóstico único. Mais recentemente, tem-se demonstrado através de estudos epidemiológicos que comorbidade, ou seja, existência de duas ou mais doenças simultaneamente no mesmo indivíduo, é muito comum em psiquiatria.
Estudo com 9.900 adultos identificou que 64% dos portadores de depressão apresentavam alguma comorbidade, principalmente transtorno de ansiedade, transtorno por abuso de substâncias (álcool e/ou drogas) e transtorno de controle de impulsos. No final deste artigo, você encontra o link para mais textos sobre outros transtornos psíquicos.
5. Depressão versus Transtorno Bipolar (TB):
Uma questão muito importante refere-se ao fato de que EDMs não ocorrem somente nos Transtornos Depressivos, mas também no Transtorno Bipolar (TB). Estima-se que até 50% das pessoas que apresentam algum EDM sejam bipolares. O não estabelecimento de um diagnóstico correto representa riscos. Quando um portador de TB em depressão recebe como tratamento apenas antidepressivos (ADs), sem o uso de estabilizador de humor, há risco considerável de piora do quadro depressivo e indução de Episódios de Mania ou Episódios de Hipomania, especialmente em pessoas jovens.
Para auxiliar nesse processo, foram estudados quais os fatores durante um EDM estão mais relacionados ao diagnóstico de bipolaridade. São eles:
• História familiar positiva para TB (um dos principais fatores);
• EDMs de início precoce na vida;
• Ocorrência de muitos EDMs de curta duração;
• Ter sintomas depressivos leves na maior parte do tempo no intervalo entre os EDMs;
• Resposta baixa a ADs já usados;
• Alta ocorrência de efeitos colaterais ativadores, tais como insônia, agitação e ansiedade durante uso de ADs;
• Indução de hipomania/mania por ADs previamente.
Quando ocorrer um EDM com características mistas, sempre se levanta a suspeita de que se trata do início da apresentação de um TB.
Os critérios para EDM com características mistas são:
Episódio Depressivo Maior (EDM) com características mistas:
NOTA: a ocorrência de um EDM com características mistas não resulta em diagnóstico de bipolaridade e sim de Transtorno Depressivo Maior. Entretanto, nestes casos, sempre se deve estar alerta para a possibilidade de estar iniciando um Transtorno Bipolar (TB).
A. São atendidos todos os critérios para um EDM, e pelo menos três dos sintomas maníacos/hipomaníacos a seguir estão presentes durante a maioria dos dias do episódio atual ou mais recente de depressão:
1. Humor elevado, expansivo.
2. Autoestima inflada ou grandiosidade.
3. Mais loquaz que o habitual ou pressão para continuar falando.
4. Fuga de ideias ou experiência subjetiva de que os pensamentos estão acelerados. Aumento na energia ou na atividade dirigida a objetivos (seja socialmente, no trabalho ou na escola, seja sexualmente).
5. Envolvimento aumentado ou excessivo em atividades com elevado potencial para consequências dolorosas (p. ex., envolvimento em surtos desenfreados de compras, indiscrições sexuais ou investimentos financeiros insensatos).
6. Redução da necessidade de sono (sente-se descansado apesar de dormir menos que o habitual; para ser contrastado com insônia).
Sintomas mistos são passíveis de observação por outras pessoas e representam uma mudança em relação ao comportamento habitual do indivíduo.
6. Tratamento:
Os tratamentos disponíveis são medicamentosos e não medicamentosos, conforme descritos a seguir. A opção entre um e outro, ou então uma combinação de ambos, é feita em conjunto (psiquiatra e paciente).
6.1. Medicamentoso:
O tratamento medicamentoso é uma opção, porém, em alguns casos, somente o uso de técnicas psicoterápicas serão suficientes.
O tratamento medicamentoso é feito com ADs. Outros medicamentos podem ser usados para sintomas específicos. Por exemplo, para insônia, dores musculares e sonolência diurna.
Para conhecer os ADs disponíveis no mercado, com seus mecanismos de ação e modo de uso, clique aqui.
6.2. Não medicamentoso:
Existe uma ampla gama de estudos demonstrando que o tratamento de TDs deve ser sempre acompanhado de técnicas psicoterápicas. Importante ressaltar que nem sempre será necessário um curso de psicoterapia intensiva, do tipo com frequência semanal. Entretanto, durante as consultas com o psiquiatra, algumas técnicas psicoterápicas devem ser usadas.
6.2.a) Motivos:
E por que isso é importante? Pelos seguintes motivos:
. Remissão mais rápida dos sintomas depressivos.
. Melhora mais substancial e mais rápida da qualidade de vida e bem-estar.
. Propicia o uso de menores doses de ADs.
. Auxilia na resolução de insônia, ansiedade e dores musculares.
. Aumenta a possibilidade de períodos mais curtos de uso de ADs.
. Aumenta a probabilidade de, depois de um curso de tratamento medicamentoso, não necessitar mais de ADs.
6.2.b) As técnicas psicoterápicas têm por objetivo:
. Identificar e implementar estratégias para resolução de sintomas depressivos.
. Identificar e implementar estratégicas para resolução de fatores estressores que possam estar causando ou agravando sintomas depressivos.
. Identificar e implementar estratégias para modificação de formas distorcidas de interpretar a realidade (para saber mais, clique aqui).
. Identificar e implementar estratégias para modificação de padrões cognitivos prejudiciais (para ler mais, clique aqui).
. Desenvolver e implementar estratégias de enfrentamento, especialmente no caso de conflitos.
. Implementar técnicas para a melhora da qualidade de vida e bem-estar, em especial, praticar exercícios físicos, ter regularidade no sono, alimentar-se de forma saudável e usar técnicas de relaxamento.
. Fortalecer a rede de suporte social.
. Fortalecer a autoestima.
. Desenvolver autonomia para lidar com fatores estressores.
6.2.c) Quais técnicas são as mais recomendadas:
. No início, sempre utilizamos a Psicoeducação. Trata-se de uma abordagem psicoterapêutica em que o princípio é aprender e refletir sobre como o transtorno psíquico se manifesta, identificar sintomas e fatores precipitantes. Além disso, avaliar questões sobre o tratamento medicamentoso, quando for o caso, considerando tópicos como o que esperar do(s) medicamento(s) usado(s), efeitos colaterais possíveis, tempo de tratamento, etc.
. Conforme o seguimento vai sendo feito, são trabalhados elementos da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC). A TCC parte do princípio de que pensamentos distorcidos levam a uma interpretação enviesada da realidade, causando sintomas (ou grande parte deles). Assim, quando temos pensamentos disfuncionais, o resultado serão emoções e comportamentos também disfuncionais, o que, em última análise, são os sintomas. Como exemplo, interpretar um pequeno problema como algo de importância e risco muito maior do que realmente é, resultando em medo intenso de que trará grandes infortúnios e perdas (catastrofização). Também trabalha com o reforço de comportamentos saudáveis e promoção do bem-estar e qualidade de vida.
. Por fim, são trabalhadas técnicas da Terapia do Esquema. Esquemas são estruturas cognitivas que contêm as crenças mais profundas sobre nós mesmos, os outros e o mundo. Quando induzem a avaliações incorretas e enviesadas da realidade, provocando emoções, reações corporais e comportamentos negativos, são chamados de disfuncionais. Os pensamentos disfuncionais derivam de crenças centrais disfuncionais. Por exemplo, uma pessoa que acredita ser incompetente e nunca ser boa o suficiente produzirá pensamentos disfuncionais compatíveis com isso. Por exemplo, quando receber uma crítica, poderá dramatizar em demasiado a situação e entender isso como uma comprovação de que realmente não é capaz. Ao contrário, alguém que acredite nas suas capacidades, poderá interpretar a crítica como algo comum, simplesmente uma sinalização de que algo pode ser feito de forma diferente.
7. Comorbidades:
A ocorrência de algum outro transtorno psíquico concomitantemente (comorbidade) com TD é muito comum. Até pouco tempo atrás, acreditava-se que transtornos psíquicos ocorrendo isoladamente fossem a regra. Chegava-se a incentivar o diagnóstico único. Mais recentemente, tem-se demonstrado através de estudos epidemiológicos que comorbidade é muito comum em psiquiatria. Esta informação é crucial para se estabelecer o tratamento de cada paciente por três motivos:
. O não tratamento de um transtorno pode acarretar a não melhora do(s) outro(s): por exemplo, não tratar Insônia pode prejudicar o tratamento de um Transtorno Depressivo.
. O tratamento de um transtorno pode piorar o(s) outro(s): por exemplo, o tratamento de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) na presença de TD pode piorar os sintomas do segundo.
. O tratamento de um transtorno pode causar a melhora de transtorno(s) comórbido(s), que era(m) considerados uma hipótese. Nestes casos, na verdade, os sintomas necessários para preencher os critérios diagnósticos do(s) transtorno(s) comórbido(s) eram consequência do primeiro e, devido a esta possibilidade, tem que ser considerado apenas como uma hipótese diagnóstica inicialmente: por exemplo, o tratamento de TD pode melhorar sintomas inicialmente entendidos como sendo de TDAH.
Por este motivo, quando há mais de um transtorno, pode haver a necessidade de se implementar tratamentos em etapas, seguindo protocolos estabelecidos. Por exemplo, no caso de TD e Burnout, inicia-se o tratamento para TD e depois para burnout.
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Dr. Daniel Maffasioli Gonçalves
Médico Psiquiatra Florianópolis
CRM/SC 20397–RQE/SC 11560