3. Detalhamento dos critérios diagnósticos:
Inicialmente é importante ressaltar que, embora não explicitamente apresentado como critério diagóstico, é muito comum haver atraso na aquisição da linguagem verbal. É comum o portador de TEA começar a falar as primeiras palavras somente após os três ou quatro anos de idade. Porém, como já citado anteriormente, em alguns casos a linguagem começa a se desenvolver no tempo esperado e tal habilidade é perdida em torno de dois anos de idade.
Para melhor entendimento dos critérios diagnósticos, a seguir estes são apresentados novamente com um detalhamento dos sinais e sintomas próprios de cada um, ou seja, da forma como se apresentam. Também são citados exemplos de como eles podem ser observados no comportamento da criança, adolescente ou adulto.
A. Domínio déficits persistentes na comunicação e interação social em múltiplos contextos:
1. Déficits na reciprocidade socioemocional:
Reciprocidade socioemocional refere-se à habilidade de receber, interpretar e responder ao ponto de vista e às emoções dos outros, tornando possível o envolvimento com as outras pessoas. Os déficits na reciprocidade socioemocional se manifestam por dificuldades em compartilhar interesses, emoções ou afeto, assim como dificuldades para perceber o estado psicológico de outras pessoas (pouca empatia).
No caso de crianças há dificuldades para imitar o comportamento de pares da mesma idade e de familiares. Além disso a linguagem tende a ser utilizada de forma unilateral, mais para solicitar ou rotular do que para comentar, compartilhar sentimentos ou conversar.
Em adolescentes e adultos ocorrem problemas para compreender e processar pistas sociais. Por exemplo, quando entram em uma conversa, podem não entender o significado implícito do que é dito ou o significado de expressões faciais, gestos e postura corporal. Em alguns casos o portador pode desenvolver estratégias compensatórias no sentido de buscar de forma consciente o que é socialmente aceito para a maioria dos indivíduos, sendo que quando faz isso em geral é tomado de muita ansiedade e precisa dispender muito esforço.
2. Déficits nos comportamentos comunicativos não verbais usados para interação social:
Trata-se de dificuldades no uso de linguagem não verbal em contextos sociais, tais como gestos, expressões faciais, entonação da fala e contato visual. Este último é um dos sinais mais comuns e mais precoces no TEA, podendo ser observado já em bebês com menos de um ano de idade.
Em crianças percebe-se a falta do gesto de apontar ou buscar objetos para serem compartilhados. Também não conseguem seguir o ato de apontar de outras pessoas. O repertório de gestos é limitado e estes não são expressos espontaneamente na comunicação, sendo em geral utilizados basicamente para satisfazer alguma necessidade, como comer, beber água, etc.
Em adolescentes e adultos existem dificuldades em coordenar a comunicação verbal com a não verbal. A linguagem corporal, gestos e expressões faciais tendem a ser rígidos e incompatíveis com o que está sendo dito ou então exagerados. O contato visual pode se manter pobre ou então ser feito com muito esforço e ansiedade, após entenderem que é algo importante para estabelecer uma interação.
3. Déficits para desenvolver, manter e compreender relacionamentos:
Em linhas gerais manifesta-se por interesse social ausente, reduzido ou atípico, que é evidenciado por rejeição às outras pessoas, passividade nas interações sociais e abordagens inadequadas, podendo ser disruptivas (interrompem o seguimento normal de uma interação) e até agressivas.
Em crianças são mais evidentes e são percebidos pela dificuldade e recusa para engajar-se em brincadeiras com familiares ou pares de mesma idade e falta de imaginação compartilhada. Quando um terceiro tenta participar de uma brincadeira, o portador de TEA insiste incisivamente que sejam seguidas de forma rígida as regras que estabeleceu unilateralmente.
Em adolescentes e adultos há dificuldades na compreensão do comportamento mais apropriado para cada situação. Por exemplo, qual o comportamento mais adequado numa situação formal, como entrevista de emprego, e numa situação informal, como numa conversa em casa com familiares.
Em qualquer idade percebe-se grande dificuldade em fazer e manter amizades, havendo preferência por atividades solitárias.
B. Domínio padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades:
1. Movimentos motores, uso de objetos ou fala estereotipados ou repetitivos:
Este critério é mais observado em crianças, visto que adolescentes e adultos podem aprender a inibi-los, pelo menos na presença de outras pessoas. Como se refere a três situações diferentes, é apresentado em três itens.
a) Movimentos motores estereotipados e repetitivos são atos involuntários recorrentes, ritualísticos e restritos. Por exemplo, abanar as mãos, estalar os dedos, balançar o corpo, balançar a cabeça, torcer os cabelos, rolar no chão, bater as mãos, andar na ponta dos pés. Algumas vezes são autoagressivos, como arrancar cabelos, bater a cabeça, bater em si mesmo, esbofetear o rosto, colocar o dedo nos olhos, morder as mãos, os lábios ou outras partes do corpo.
b) O uso de objetos de forma estereotipada e repetitiva é observado por uma forma atípica, recorrente e ritualística da utilização de objetos. Em crianças pode-se obervar que ao invés de brincar com carrinhos e bonecas, por exemplo, conforme o esperado, estes são enfileirados ou empilhados repetidas vezes. Em geral, após colocados em fileiras ou pilhas, tudo é desorganizado para novamente enfileirar ou empilhar. Também é comum girar moedas.
c) Por fim, a fala estereotipada e repetitiva é observada pela repetição de palavras ouvidas (ecolalia), uso do você para se referir a si mesmo e uso incomum de palavras ou frases.
2. Insistência nas mesmas coisas, adesão inflexível a rotinas ou padrões ritualizados de comportamento verbal ou não verbal:
Este critério refere-se à rigidez comportamental e cognitiva vista em portadores de TEA, sejam crianças, adolescentes ou adultos. Trata-se de uma característica quase sempre presente e se caracteriza pela falta de flexibilidade para modificar comportamentos e rotinas.
Em qualquer idade existe grande resistência a mudanças e a novas formas de fazer as coisas. Pequenas alterações no dia a dia são vivenciadas com muito sofrimento. Por exemplo, organizar os itens na mochila de forma diferente, sair para uma viagem de passeio no final de semana, modificar horários de acordar, alterar o caminho para a escola ou trabalho, embalar o alimento preferido de forma diferente.
Em relação a padrões ritualizados de comportamento verbal e não verbal, pode-se citar como exemplos perguntas repetitivas, andar em círculos, ter rituais de saudação e caminhar de forma atípica.
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Dr. Daniel Maffasioli Gonçalves – Psiquiatra em Florianópolis e Caxias do Sul
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